25-02-17
RPGs de Mesa e a Arte de Contar Histórias
Recentemente li "A Aventura da Leitura e da Escrita entre Mestres de Roleplaying Game", de Andréa Pavão, livro construído a partir da dissertação da autora acerca dos potenciais educacionais dos RPGs de mesa. A obra é relativamente antiga, datada de 2000, e nela a autora elabora sobre a possibilidade de utilizar roleplaying como uma forma mais lúdica de aprendizado da escrita e leitura, algo que infelizmente não foi desenvolvido de forma substancial no ramo da educação mais de duas décadas depois. Apesar de não ter sido influente nesse sentido, a análise traz um ponto sobre o qual eu não havia pensado a fundo antes com a seguinte citação, tirada do prefácio de uma edição de GURPS e referindo-se aos jogadores de RPG: "Os participantes descobrem a arte ancestral de criar, ouvir e contar histórias". De fato, RPGs são de certa forma um resgate e uma reinterpretação da arte de contar histórias, com a importante diferença do acréscimo de um aspecto participativo. Os jogadores e mestre juntos moldam a narrativa e a aventura, cada um influenciando de diferentes formas e baseado na sua própria existência subjetiva, as suas experiências, memórias, gostos e desgostos, etc. Isso é muito diferente do consumo passivo de histórias que estamos acostumado a ver na maioria dos outros meios, puxando desde o passar de mitos da Grécia Antiga. Até mesmo outros meios considerados mais interativos, como videogames, não chegam a esse nível; em um jogo eletrônico, não importa quanto tempo e recursos sejam investidos em seu desenvolvimento, o jogador ainda está seguindo uma série pré-determinada de instruções e um corpo limitado de código.
Imagino que esse ângulo seja bastante óbvio para a maioria dos fãs de RPG de mesa, mas eu, mesmo havendo participado de diversas sessões e campanhas antes, nunca parei para pensar nesse fato que o torna tão especial. Acredito que também é esse aspecto único que ao mesmo tempo torna esse nicho um repleto de fãs extremamente dedicados e apaixonados, como o torna algo estranho e quase inacessível às massas.
Na dissertação já mencionada, a autora comenta sobre a preocupação com o abandono às "brincadeiras corporais e socializadoras" em meio a um mundo cada vez mais digital e computadorizado. Hoje, 25 anos depois, tais preocupações estão maiores do que nunca, considerando a maneira que a internet e as redes ocupam nossas vidas e praticamente sugam nossas almas dia após dia, e isso me faz acreditar que algo como D&D seria uma força positiva no mundo atual, que participar de campanhas ajudaria a curar muito dos males que tanto permeiam a nossa mente desde as últimas décadas. Quem sabe eu mesma deveria tentar encontrar um grupo, apesar de não fazer ideia de onde começar.